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Takeover: A facilidade de compra da Anheuser-Busch pela Inbev explicada por dentro de um jogo familiar.
Oferta hostil encontra o aliado mais que perfeito
Dethroning the King - The Hostil Takeover of Anheuser-Busch, an American Icon"
Julie MacIntosh. Wiley. 408 págs., US$ 27,95
"A Budweiser são os Estados Unidos numa garrafa", custumava dizer o presidente da AB InBev, o brasileiro Carlos Britto, quando apenas cobiçava o controle da principal marca da Anheuser-Busch. "Não temos uma placa de 'vende-se' na porta dos Estados Unidos", reagiu a senadora Claire McCaskill, do Misssouri, onde a Anheuser-Busch está sediada, logo depois de Britto explicar pessoalmente as suas intenções de comprar a empresa.
Um livro que acaba de ser publicado nos Estados Unidos, ainda sem previsão de tradução para o português, conta um outro lado da história. Em "Dethroning the King - The Hostile Takeover of Anheuser-Busch, an American Icon", a jornalista Julie MacIntosh, que cobriu a operação pelo "Financial Times", revela que a InBev teve ajuda de dentro da Anheuser-Busch. Pelo que tudo indica, o poderoso August Busch III decidiu que venderia a empresa que ele próprio tornou uma gigante. Nas semanas seguintes, apenas ensaiou alguma resistência, estimulando negociações para uma fusão com a cervejaria mexicana Modelo, com o propósito único de forçar o aumento da oferta da InBev de US$ 65 para US$ 70 por ação.
Os brasileiros da InBev e a família Busch não eram completamente estranhos entre si. Em 1991, os donos da Brahma, Marcel Telles, Carlos Alberto Sucupira e Jorge Paulo Lemann, propuseram uma fusão para criar o que eles chamaram de uma Coca-Cola do mundo das cervejas. Nela, a Anheuser-Busch tomaria conta dos Estados Unidos, enquanto o trio de banqueiros de investimento do Garantia cuidaria das operações internacionais. Busch III viu excesso de audácia na proposta dos brasileiros e decidiu rejeitá-la.
Alguns anos depois, em 1994, a Anheuser-Busch estava à procura de um parceiro para distribuir a Budweiser no Brasil. As negociações com a Brahma foram muito duras, e no fim os americanos acabaram comprando uma participação minoritária na Antarctica. Eles pularam fora do negócio, porém, alguns anos depois, quando a Brahma foi adquirida pela Antarctica, numa operação que Busch III acreditava que seria rejeitada pelos órgãos brasileiros de defesa da concorrência. A falta de ambições internacionais é apontada como uma das causas que levaram a Anheuser-Busch a se tornar presa de uma oferta hostil. A companhia perdeu a chance, por exemplo, de juntar esforços com a sul-africana SAB Miller, depois de exaustivas negociações.
O livro conta uma trágica história familiar. Busch III, quarta geração da família que adquiriu e deu seu sobrenome para uma cervejaria fundada em 1852 em St. Louis, assumiu a presidência da companhia depois de fazer manobras para tomar o lugar do próprio pai. Ele fez com que a fatia da Anheuser-Busch no mercado de cervejas saltasse de 28% para 52% entre 1977 e 2002, investindo na qualidade dos produtos e, principalmente, em marketing, com comerciais que ganharam os principais prêmios da propaganda americana.
Entre os banqueiros de investimento que assessoraram a Anheuser-Busch, Busch III tinha o apelido de "Crazy" (louco), por seu excesso de exigência, detalhismo e crueldade com que tratava os principais assessores. Não poupava nem mesmo o filho e sucessor, Busch IV, conhecido como "Lazy" (preguiçoso), que presidiu a companhia debaixo da desconfiança e sabotagens do pai.
A Anheuser-Busch representa um pouco das mazelas que fizeram o capitalismo americano afundar na atual crise. Com posição dominante no mercado e margens gordas, a empresa não tinha muitas preocupações em cortar custos. Mantinha uma frota particular de jatos para uso de seus executivos, conhecida como "Air Bud", gastava bastante em filantropia em St. Louis e distribuia cerveja grátis para os funcionários. Uma empresa com muito caixa e gordura é uma presa fácil, pois cria condições propícias para levantar empréstimos bancários para bancar a aquisição. Não ajudava muito o fato de que a família Busch, naquele momento, tinha apenas 4% da companhia.
Quando o controle da Anheuser-Busch sucumbiu às mãos brasileiras, Britto viajou para St. Louis e rapidamente implantou um estilo espartano. As divisórias entre os escritórios foram derrubadas, os executivos trocaram os ternos por calças jeans, houve demissões em massa e acabou a distribuição de cerveja grátis. "Não preciso de cerveja grátis", explicou Britto, segundo relato do livro. "Posso comprar minha própria cerveja."
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